CULTO A SANTA MUERTE - MÉXICO
Se nas ruas o México trava uma batalha diária contra a violência, no
plano espiritual, o inimigo a ser combatido é outro: segundo padres católicos,
o país está sob ataque do 'Satanás'.
O Diabo, afirmam os religiosos, seria o responsável pela recente onda de
violência que assola o país, impulsionada pelo tráfico de drogas.
O assunto é encarado de forma tão séria pela Igreja Católica que o
número de padres especializados em exorcismo - prática que expulsaria espíritos
malignos - também vem crescendo no México.
Segundo os últimos dados
disponíveis, pelo menos 70 mil pessoas morreram vítimas da violência no país,
incluindo criminosos, membros das forças de segurança e civis inocentes.
Mas, para os padres, não
se trata apenas de números. A selvageria dessas ações também vem chamando
atenção.
Nos últimos anos, vêm se
tornando cada vez mais frequentes, em várias partes do México, casos de
crianças que acham corpos desmembrados nas ruas quando vão à escola. Ou
motoristas que, enquanto dirigem, passam por pontes com corpos pendurados.
"Nós acreditamos
que, por atrás de todos esses episódios, há um agente das trevas cujo nome é
Satanás. Nosso Deus quer que tenhamos aqui um ministério do exorcismo e liberação,
para lutar contra essa força obscura", diz o padre exorcista Carlos
Triana, da Cidade do México.
"Assim como
acreditamos que Satanás estava por trás de Adolf Hitler, possuindo e dirigindo
ele, também acreditamos que ele (Satanás) está por trás dos cartéis das
drogas."
Os padres exorcistas do
México dizem que, nos últimos tempos, cresceu a procura por seus serviços.
A demanda é tão alta que
alguns deles já estão recusando atendimentos, uma vez que precisam exorcizar
demônios praticamente todos os dias.
"Isso não acontecia
antes", diz o padre exorcista Francisco Bautista, outro exorcista na
Cidade do México.
A maioria dos casos,
explica ele, requer uma forma mais branda de exorcismo, chamada "orações
de liberação", eficaz quando a pessoa ainda controla parte de sua mente ou
do seu corpo.
Nos casos mais raros,
quando o Demônio possui alguém completamente, diz ele, o bispo da diocese tem
de intervir.
'Santa Muerte'
Na avaliação de
Bautista, a crescente demanda pelo exorcismo é parcialmente explicada pela
grande quantidade de mexicanos participando do culto da Santa Muerte.
Estima-se que o culto,
cujos frequentadores veneram um esqueleto vestido de noiva carregando uma
foice, tenha cerca de 8 milhões de seguidores - incluindo aí imigrantes
mexicanos na América Central, nos Estados Unidos e no Canadá.
"Esse culto foi
adotado por traficantes de drogas que pediram ajuda à Santa Muerte para evitar
ir à prisão e ganhar dinheiro", diz Bautista. "Em troca, eles
oferecem sacrifícios humanos. E por isso a violência vem aumentando",
explica.
Outra razão para o
crescimento dos exorcismos, argumenta Bautista, é a descriminalização dos
abortos na Cidade do México, em 2007. Tanto o culto quanto o aborto deixaram o
México vulnerável aos espíritos malignos, insiste ele.
"As duas coisas
estão relacionadas. Há uma infestação de demônios no México porque nós abrimos
as portes para esse tipo de crença", explica.
Se causa surpresa o
número de mexicanos que acredita na Santa Muerte, também provoca espanto
quantos deles, como os padres Triana e Bautista, creem que o Diabo e os
demônios estão "operando" no país.
O exorcismo é uma
prática antiga e aparece em diferentes religiões, mas muitos fieis duvidam da
existência de demônios.
A linha de frente dos
exorcistas no México é a região norte do país, onde, nos últimos sete anos, os
militares vêm combatendo os cartéis de drogas.
Tal como os soldados, os
sacerdotes têm travado ali um conflito espiritual. Um desses padres é Ernesto
Caro, que vive em Monterrey, uma cidade marcada por tiroteios e sequestros
freqüentes.
Ele exorcizou vários
membros dos cartéis de drogas - e de um caso em particular ele não se esquece.
Era um assassino de uma gangue, que confessou crimes terríveis. Caro disse que
o homem cortava as vítimas em pedaços e gostava de ouvi-las chorar enquanto
decepava seus membros. Além disso, também queimava pessoas vivas.
Segundo o padre, o homem
havia dedicado sua vida ao serviço da Santa Muerte.
"O culto é o
primeiro passo para o satanismo e, em seguida, para este grupo de pessoas [os
traficantes]. É por isso que ele foi escolhido para esse trabalho."
"A Santa Muerte
está sendo usada por todos os nossos traficantes de drogas e aqueles vinculados
a esses assassinatos brutais. Descobrimos que a maioria deles, se não todos,
são devotos da Santa Muerte", acrescenta.
O culto também é
frequentado por criminosos, policiais, políticos e artistas.
"A maioria dos
fiéis vem dos setores mais pobres da sociedade mexicana", diz o jornalista
José Gil Olmos, que já publicou dois livros sobre o assunto.
Culto
As primeiras referências
à Santa Muerte surgiram no século 18, explica Olmos, e não em tempos astecas,
como muitos acreditam.
"Na era moderna, o
número de seguidores explodiu, especialmente após o início dos anos 1990,
quando o México mergulhou em uma grande crise econômica."
Naquele período, muitos
mexicanos de classe média encontraram-se na miséria. Desesperados, procuraram
conforto na Santa Muerte, acrescenta Olmos.
"Mas há oito anos,
a Santa Muerte ganhou acolhida entre membros do cartel de drogas. Por quê?
Porque essas pessoas dizem que Jesus ou a Virgem Maria não podem lhes dar o que
eles pedem, ou seja, proteção contra os soldados e policiais, seus
inimigos."
A reportagem da BBC
Mundo, o serviço em espanhol da BBC, visitou o maior culto da Santa Muerte, uma
cerimônia anual que acontece no bairro de Tepito, na Cidade do México, um local
fortemente marcado por crime e tráfico de drogas.
Ali se localiza um dos
maiores santuários da Santa Muerte no México. O altar é mantido arrumado por
Enriqueta Romero, de 60 anos, cuja vida mudou drasticamente há 12 anos, quando
chocou seus vizinhos colocando uma figura da Santa Muerte em sua janela.
Ao longo dos anos, mais
e mais pessoas começaram a se aproximar para pedir ajuda ou agradecer à
divindade. E agora, milhares se reúnem ali para a cerimônia mais importante da
veneração, que ocorre anualmente no dia 31 de outubro, véspera do Dia de
Finados, no México.
"A Santa Muerte nos
ama e nos cura. As pessoas vêm aqui para pedir-lhe ajuda, desde a um filho na
prisão ou com Aids, ou algo para comer", diz Romero.
Durante a visita da
reportagem, algumas pessoas chegavam ao santuário ajoelhadas. Uma delas era um
homem que carregava um bebê de 20 dias em seus braços. Ele diz ter vindo para
apresentar sua filha recém-nascida à imagem da Santa Muerte.
Mas todas essas pessoas
estão possuídas, como a Igreja diz?
"Não, eu também
acredito em Deus, na Virgem Maria, e em todos os santos, mas sou mais devoto da
Santa Muerte. Ela é a única que me ajuda mais", diz José Roberto Jaimes,
um homem de 20 anos que veio de joelhos para agradecer à divindade depois de
passar três anos na prisão.
Afastamento
Romero diz acreditar que
a própria igreja seja responsável pela ascensão do culto, dado o número de
escândalos de pedofilia que vieram à tona nos últimos anos.
"Acabaram com a
nossa fé quando soubemos o que os padres vinham fazendo. Qual direito eles têm
de nos criticar? Que acreditamos na Santa Muerte? Isso não é ruim. O ruim é o
que eles fizeram", diz Romero.
Questionado sobre o que
acha de criminosos também seguirem a seita, Romero afirmou que "estamos em
um país livre e todos podem fazer o que quiser. Todos teremos de responder a
Deus em algum momento", diz ele.
Foi o ex-presidente do
país, Felipe Calderón, que lançou a ofensiva contra os cartéis de drogas no
México em 2006, com o envio de tropas militares às regiões mais atingidas pela
criminalidade.
Ao longo dos anos, os
militares descobriram numerosos santuários, templos e até mesmo igrejas da
Santa Morte, além de inúmeras evidências de sacrifício humano.
"Ele (Calderón)
começou uma guerra contra esses bandidos. Também começou uma guerra contra o
culto à Santa Muerte e pediu à Igreja para ajudá-lo", diz o padre Caro.
"Mas a Igreja não
está dizendo que o México ficará melhor e a salvo se nós fizermos exorcismo
porque o Diabo está por trás de tudo isso", completa o padre Triana.
"Nós temos de ser
discretos (com essas práticas), do contrário nós podemos ser ridicularizados,
até mesmo por nossos seguidores", conclui Triana.
"E SE O MEU POVO, QUE SE CHAMA PELO MEU NOME, SE HUMILHAR, E ORAR, E BUSCAR A MINHA FACE, E SE CONVERTER DOS SEUS MAUS CAMINHOS, ENTÃO, EU OUVIREI DOS CÉUS, E PERDOAREI OS SEUS PECADOS, E SARAREI A SUA TERRA."
2 CRONICAS 7:14
FONTE: 27/11/2013 08h03 UOL NOTICIAS
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